terça-feira, 25 de janeiro de 2011

Como a viagem de ônibus é longa  entre São Roque e Sorocaba, resolvi levar, além de meu celular com algumas de minhas músicas favoritas, um livro. Parei de ler duas páginas depois, primeiro porque ônibus intermunicipais dão um enjôo imenso, segundo porque esse trecho me deu o que pensar: 

"Não era um devasso. Quando agia assim, ficava dominado pela repulsa contra seu ato e o medo das conseqüências. Era só sua fantasia que seguia um caminho mórbido. À medida que os dias da semana, um após o outro, se depositavam como chumbo sobre sua vida, aqueles encantos corrosivos começavam a atraí-lo. As lembranças de suas visitas se aglutinavam numa tentação única. Bozena aparecia-lha como uma criatura de inacreditável baixeza, e sua relação com ela, a sensação que era obrigado a suportar, parecia-lhe um cruel culto de sacrifício a si próprio. Excitava-o ter de abandonar tudo aquilo em que normalmente estava encerrado, sua posição privilegiada, as idéias e os sentimentos que lhe impunham, tudo aquilo que nada lhe dava, que apenas oprimia. Excitava-o escapar para junto daquela mulher, nú, despojado de tudo.
Com todos os rapazes era assim. Se Bozena fosse bela e pura, e ele fosse capaz de amar nesse época, talvez a mordesse toda, exasperando até a dor o seu prazer sexual e o dela. Pois a primeira adolescente não é amor por uma pessoa, e sim o ódio a todas as pessoas. Sentir-se incompreendido e não compreender o mundo não é o efeito de uma primeira paixão, mas sua causa. A paixão é apenas um refúgio, no qual estar com o outro significa solidão duplicada.
 Quase sempre a primeira paixão pouco perdura e deixa um ressaibo amargo. Trata-se de um logro, uma decepção. Quando ela passa, não compreendemos como fomos capazes de tudo aquilo, nem sabemos a quem culpar. Iso acontece porque as personagens desse drama em geral se encontram por acaso: eventuais companheiros de uma fuga enlouquecida. Apaziguados, não se reconhecem mais. Percebem que são diferentes, porque já não se dão conta do que tem em comum." 

MUSIL, Robert. O jovem Törless. tradução de Lya Luft. São Paulo: Folha de São Paulo, 2003.


Para unespianos que ficaram curiosos: A professora Ana Maria, da área de alemão, tem uma tese recém-defendida sobre esse livro (desculpem.... não lembro o nome da tese. Aliás, se alguém souber, deixe-me um recadinho ;D)

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