sexta-feira, 30 de abril de 2010

Odeio fazer provas e trabalhos em grupo. Descobri, faz pouco tempo, uma coisa em mim que posso, muito facilmente, chamar de individualidade exacerbada, quase narcisismo, e me dói à beça ver o "escriba da vez" resumir meu texto.
O meu texto, meu amado texto! Aquele que sofri para tirar desse mundo de sinapses de que é constituído meu cérebro e que sofri para passar no papel. Meu amado texto, jogado fora, dilacerado por outras mãos!
Acaso não percebes o quão importante ele é para mim? Acaso não vês que, se escrevi, é porque era essencial para o que eu queria dizer? Não é poema! Não é poema... não é poema..... Como assim não é poema? De fato não é, mas eu quero que tenha traços de poema no meu texto, por que não? 
Diria você que o tempo está acabando. Dane-se a droga do tempo! Eu fico, eu escrevo, mas não corte, dilacere, reduza meu texto à mera resposta... dói. Dói.... Dói! É dor física, é dor mental, é dor de autor.

sábado, 17 de abril de 2010

Mau demais, nas Catedrais!

Compromisso cumprido, saí sem rumo pela cidade grande, com uma sensação de alívio diferente. Não felicidade, alívio!
Onde será que acaba essa ponte? Andar por onde você não conhece? Se bem que é cedo ainda, não? Ah, vamos ver! Olha..... quanto ônibus lá embaixo! Deve ser um terminal.....
O que essa louca está gritando? A amiga dela não vai ouvir nunca! Que bom que o amigo dela lembrou-a disso! Obrigada, senhor!
Eu deveria ter dito isso, e mais isso, e mais isso. Chega, garota, você não disse! Fez o que pode na hora. Nada mais, nada menos. Eita...quando é que eu pensei que o acharia no meio de tanta gente?Que feliz!
Olha... eu vim por uma rua parecida com essa. Subindooooooo!
Bom dia!
Encruzilhada.... continuar a subir, virar a direita e subir a outra rua ou virar a esquerda e descer? Dane-se! Subir! 
Nossa... que prédio lindo! Bem que o Luís me disse que eu ia gostar daqui. Mas ele disse para eu vir no domigo, não em plena sexta feira.... Ops, que horas são? Nem deve ser nove... foi mais rápido do que eu esperava. Se eu soubesse disso, teria ido embora depois, para ver a aula no noturno. Ahhhhhhhh... à merda você e a aula! Já faltou mesmo, fique em casa! 
Subindo... Nossa, que prédio grande! O que será que é isso?... Ah sim, uma igreja. Nossa... é bonita!
Olha.... um franciscano na porta da igreja. Uoloko.... é o Largo São Francisco! Nossa.... é bonito, mas eu pensei que fosse maior... E nossa, é aqui? Que x isso!
Ai que bonitinho esse anjo! E que cara de sapeca! Um casal, ao que parece... blá blá blá.....Caraca, Álvares de Azevedo! Foi poeta, amou e sofreu na vida... Homenagem dos estudantes de Direito do Largo São Francisco. Porra, Álvarez de Azevedo.... foda!
Continuando.... direita sempre!
Nossa... que cheiro! Pessoas de terno... advogados... bem próprio! Arg... urina! Que horror!
Que prédio é esse? Olha, é a Saraiva! Entrou ou não? Ah... os estudantes de letras! Blá! Deve estar fechado. Tem um cara lendo lá dentro!
Semáforo vermelho.... Espere! Não vai fazer que nem aquela outra vez, porque não tem Karen para te gritar hoje, garota!
Será que já dá para atravessar? Bom, siga os que assim o fizeram!
Olha.... o teto de uma igreja.... acho que coheço essa! Já sei onde estou!
Bom dia, bom dia, bom dia... sorrisos! 
Eita, polícia! Documentos pedidos para dois caras suapeitos. Ai senhor, segura a bolsa!  Ai senhor, olha aonde você foi se enfiar. Andar por aí, onde não conhece? Ai como você é neurótica!
Eita, o que esse cara tá correndo, senhor? Ufa... nada de mais. Olha aonde você está, pessoa! Estranho seria se ninguém corresse!
Olhaaaa... um cabeludo! De que banda será aquela camiseta.... Arrrggg... não dá pra ver! Para de olhar, você vai ser roubada! Segura a bolsaaaaaaaa!
Oi, por favor, bom dia. Como eu faço para chegar na Estação da Luz? Nossa moça, você tem voltar para lá e... Não! Vai por aqui! Qual é a estação de metrô mais próxima? Ahhh... é a Sé...-por isso eu digo que você não tinha noção de onde estava, sua louca!- ... Mas você está a pé? Estou. Ah... mas então é melhor você voltar por ali e seguir sempre reto que você vai encontrar. Não.... dá pra ir para a Sé sim. Moça, você vai passar essa, daí você vai descer e virar para a direita. Que direita? Esquerda! Ela vai fazer assim, ó - aponta com o braço, segurando a vassoura- Não, é direita! É direita! Mas então, moça: você vai fazer o seguinte: não essa rua, a próxima, você vai descer e virar a direita e já está na estação da Sé. Muito obrigada!
Então fulana.... era direita! Não, esquerda!
Eita, mas será que elas vão ficar discutindo isso? Ráh, que engraçado! 
Passou uma, segunda rua, desci. Todo mundo andando depressa, que beleza! Nossa, que prédio será esse? Cheio de segurança!
Olha, a estação Sé. A primeira moça tinha razão, era direita!
Uou! É a Catedral da Sé..... eu sabia que conhecia isso! Entro ou não entro? Não estou fazendo nada mesmo, não tenho pressa.... Vou entrar! 
Subi as escadas, dando risada de um moço que estava, com um amigo, tirando foto na porta da Catedral. Entrei. Nossa, que lindo! Que grande!
Olhei tudo ao meu redor. Muito grande! Olhei a porta da Catedral. Pé altíssimo!
De repente, me senti mau. Me senti pequena demais diante daquilo tudo. Aquela coisa toda da Idade Média que eu tinha estudado me transcorreu as veias em instantes. Igrejas grandes para fazer com que as pessoas se sintam pequenas e procurem ajuda divina. Continuei andando. Havia algumas pessoas sentadas nos imensos bancos dispostos em três filas, também imensas. Peguei o lado direito da igreja e por ele transcorri toda a sua extensão. Os vitrais eram bonitos, mas muito grandes. Muito grandes mesmo!
Os confessionários, protegidos por correntes e no escuro da igreja pareciam pequenas jaulas de onde podeia sair, a qualquer hora, uma figura assustadora, só para me dar medo. E foi essa a impressão que tive percorrendo toda aquela extensão. Silêncio mortal contribuía para a tensão da cena. Pilares altíssimos, altíssimos!
Voltei, ainda pelo lado direito, até o final do corredor, em direção a porta por onde eu havia entrado. Parei meus olhos na caixinha de folhetos de missa. Logo após a famosa caixinha de contribuição, com a famosa inscrição 'Colabore com a manuntenção da Catedral'... De fato, ela está bem conservada. O segurança me olhando. Sorri. 
Olhei a minha frente, lado esquerdo da igreja. Barraquinha vendendo terços e outras coisas próprias do recinto. Muito próprio, pensei. Única interrupção do silêncio, por enquanto. Peguei o lado esquerdo e comecei a andar. Vitrais bonitos, mas grandes, muito grandes. Anjos de uma cor dourada que presumi que fosse ouro. Claro, é ouro. Isso explica os seguranças. Nossa, o senhor não está dando conta de cuidar nem da própria casa? Cômico, no mínimo! Pensei que essa igreja talvez nunca conseguisse ficar cheia. Também pensei como seria casar ali, quanto seria o aluguel dela para essa ocasião, se é que se alugam igrejas para isso. Nem namorado, quanto menos noivo ou marido!
Anjos dourados, maiores que eu, pareciam ser estátuas vivas, só esperando eu passar para se mexer e, com isso, me asustar. A realidade de suas formas era coisa a se achar de muita qualidade, de muita valia, fato! Vi depois que, incrustadas nas paredes, esculturas douradas do que pareciam, pelas roupas, serem pelo menos bispos da Catedral, sé é que não eram representações dos vários papas da Igreja. Também parecia que iam sair a qualquer hora das paredes, adquirindo nova vida.
Órgão sendo tocado. Ah, sim! Isso explica as pessoas sentadas. Missa em seu início. É mesmo... eu vi nosso amigo, o Cardeal- é esse o nome de quem controla a Catedral?- olhando um livro com um rapaz sentado do outro lado da igreja. Escolha de músicas, missa começando, claro! Mas isso não explica as duas pessoas que vi cochilando nos bancos, nem o cara que eu vi entrar rindo e falando algo alto do lado direito da igreja. Vai saber.....
Olhei mais uma vez: vitrais coloridos, grandes colunas, escadas imensas, incrições em latim que nem eu sabia o que significava, altar muito grande, muito grande mesmo, colunas grandes, muito grandes, imensas... e os seguranças. Sair daqui já! Sorri para o segurança e saí. Segui o ritmo de quem passava lá fora, me esquivando, ora para a esquerda, ora para a direita, com a mesma cara de alívio de antes, e desci.  
Estação da Sé. Moça, quer tirar foto, precisa de um endereço? Susto! Senhor, vi o Quasímodo na minha frente!Que maldade, garota! Não, obrigada! Dirijo me a escada. Moça, precisa de algum endereço? Não, já achei- aponto para a entrada da estação. Quer tirar uma foto? Não, obrigada. Outro rapaz, desta vez um afrodescendente encorpado. 
Desci as escadas e, depois de me perder nas indicações, coçar a cabeça repetidas vezes, como faço toda vez que me sinto confusa ou com muita raiva, e de perguntar como fazia para embarcar, achei a tal entrada e vi que não tinha mudado muito da que eu estava acostumada a pegar antes. Eu só tinha entrado pela esquerda. Olhar as coisas de outro ângulo... eu disse que gostava! Descendo! Esse caminho eu conheço de cor já! 
Saí no meio daquele povo todo. A cabeça fruto de vários sonhos, lmbranças, uma melodia. Passei a catraca, desci a escada rolante na lerdeza do mecânico em contraste com peso e a rapidez do Metal, cheguei até a plataforma de número cinco, com a famosa cara de má que me toma quando sozinha, a levar meu corpo de sobrepeso por toda essa coisa que se chama vida, por meio de passos, quando vi algo que me acordou e que me fez querer dormir para todo o sempre, amém!
Um senhor, ao me ver, levantou de onde estava sentado. Um jovem pediu a caneta emprestada e, ao ouvir o senhor dirigir a mim a palavra, fui logo dizendo um 'depois dele'.
Então percebi o que o senhor queria: ele queria que eu preenchesse a passagem dele. O senhor era analfabeto. 
Preenchi a passagem e dei as indicações ao senhor quando este, sozinho, entrou no ônibus.
Fiquei feliz por ter feito isso. Dizem que as boas ações enchem a alma de alegria e recebem a devida recompensa ao seu devido tempo, mas não pude deixar de pensar que mundo cão é esse que não dá à todos a dignidade do saber, muito menos as condições necessárias para que alguém possa se virar, sem dependência, dentro dele. E mais: qual é o risco/preço de se confiar em outras pessoas num lugar em que os honestos são tidos, para se falar o mínimo, como tolos? You know it´s sad but true... Sad, but true!