domingo, 7 de outubro de 2012

Joe, Engel, o acaso e Christiane F.

O acaso sempre fez parte da minha vida. Nele acredito e com ele tenho histórias mil para contar. Foi ele quem me fez descobrir o youtube. Foi ele quem me fez descobrir filmes inteiros no youtube. Foi ele quem me fez descobrir artigos sobre filmes alemães inteiros no youtube.
E foram o youtube e o já citado artigo sobre filmes alemães que me fizeram ver o famosíssimo Christiane F., que muito pouco ou nada tem a ver com esse pretenso texto.
Christiane F. é mesmo uma obra prima. É tudo o que falam: pesado, assustador, extremamente real e, acima de tudo, inesquecível. Não há, de fato, como passar por ele sem refletir sobre o problema das drogas, seus efeitos nos indivíduo e na sociedade e os outros males que ela acarreta ou sustenta.
Mas, como esse pretenso texto pouco ou nada tem a ver com coisas certas, nem com o Christiane F., como já disse, e sim com o danado do acaso, o que veio depois desse filme foi o que me fez escrever.
Como já é sabido até por mim, o youtube apresenta vídeos relacionados ao que você está assistindo. Não me pergunte como é feita essa relação, pois há coisas lá que simplesmente não combinam com o que você assiste no momento, ou pouco o fazem.
E de repente, lá estava eu, diante de um título bastante intrigante: Joe e Engel: A nova geração Christiane F. Fiquei super curiosa, pois acabara de assistir ao que seria o primeiro de uma –agora descoberta- série de filmes e, claro, queria terminar a tarefa.
Adianto que Joe e Engel nada tem a ver com “Nós, as crianças da estação” (Esse é o nome real do Christiane F. [da série Oi, eu sei alemão! =D]), exceto um dos, salvo engano, roteiristas.
O assunto é, vinte e cinco anos depois, novamente a juventude transviada de Berlin. Nele estão de novo as drogas, o sexo, a prostituição (por que não?). Nele são novos a gravidez precoce e algo que me fez amá-lo tanto a ponto de assistir trocentas vezes seguidas, coisa que só acontecera anos antes, com o clássico Laranja Mecânica.
Esse algo foi a delicadeza das coisas que não se mudam com facilidade e a força de vontade que elas exigem, sem se deixar ser audacioso, inquieto e deveras sensível.
Joe é uma jovem como outra qualquer, exceto pela mãe viciada em remédios e em um relacionamento tumultuado que desencadeia o vício em remédio. Cansada desse ciclo, ela resolve sair de casa e tomar conta da própria vida, levando apenas uma bolsa, um casaco, a roupa do corpo e Rasta, seu fiel cão.
De novo o acaso! É por ele que Rasta foge da dona e sai correndo, ao encontro de um grupo de amigos punks que brinca entre si numa das calçadas e vai morder justo o pé de Engel, um punk deveras sensível, em vias de largar o vício em drogas (na verdade, só se entende que ele foi de fato viciado no decorrer do filme) que mora nas ruas, pois foi abandonado pelos pais em um orfanato- coisa que a gente entende só com o filme bem adiantado.
Esse logo se interessa pela garota nada acostumada à vida nas ruas, a defende de um grupo de fascistas em um show, dá-lhe abrigo e a introduz ao grupo com quem anda. Aos trancos e barrancos, essa relação nada comum vai se desenvolvendo e vira uma paixão. Planos são feitos: Engel conta à namorada que planeja sair de Berlin e ir para o campo, onde fundará uma comunidade anarquista de subsistência e ele decide ir com ele.
 Porém, em uma briga, Joe acaba por ser estuprada (acho que poderia definir a cena com esses termos) e Engel encontra a polícia, enquanto a procura Joe pela estação de trem onde ocorreu a briga, e, ao tentar fugir dela, é atropelado.
O ponto de virada do filme é exatamente esse, pois, Joe se descobre grávida e Engel se dispõe a assumir o filho que, devido ao estupro, pode não ser dele.
Para sustentar esse filho, Engel procura emprego, mas não consegue ficar em nenhum deles, primeiro pela aparência, depois por que ninguém acredita na história “mulher e filho pequeno para sustentar”, o que o faz roubar para que Moisés não precise aprender a engatinhar em um cemitério.
Assim que consegue tirar sua amada e o filho do hospital, Engel acaba preso e Joe volta para casa, apoiada por uma assistente social, pela mãe e pelo skatista, suposto pai “playboy” do filho dela.
Engel escreve cartas mil e Joe responde apenas uma delas acabando o relacionamento, o que  o leva ao desespero total e a volta ao vício em drogas.
No Natal, Engel consegue sair da cadeia e vai visitar Joe, que decide, novamente, viver com o namorado.
É Joe quem exerce papel importante no desenrolar da trama até seu final. É ela que tem um misto de delicadeza e força para conseguir resolver todos os problemas que aparecem. Não que Engel seja um descontrolado, mas ele se revela mais sensível e carente do que ela.
 O filme todo faz esse jogo com o delicado e o racional, necessário, além de mostrar que a tal da juventude transviada pode sim, crescer e buscar o que é melhor para si. Basta a força de vontade que Joe representa, em minha opinião.
Com relação a coisas mais técnicas, das quais eu pouco sei, chamou-me atenção a fotografia, que constrói significados por ela mesma (atente-se para a última aparição de Moisés e a cena que se segue.... achei primorosa!), opondo os raros colorido e claro ao escuro e sombrio de cada cena, o que faz lembrar sim o filme anterior do roteirista.
Também chamou-me a atenção a trilha sonora, que não é o Bowie do filme anterior, mas tem músicas muito boas e muito bem inseridas nas cenas.
Clichês, como o famoso “fugere urbem” (era assim que escrevia? =D) ou “o interior é mais legal” existem, é claro, no filme. É mais uma metáfora de vida nova e superação do que de descanso, em minha opinião. Outro clichê bastante aparente é a existência da família, que aqui serviu tanto para destruir as personagens, como para guiá-las, redimindo a instituição no final.
Joe e Engel: a nova geração Christiane F. é um filme excelente, bem balanceado entre o delicado do mundo, sem ser piegas, e o seu ponto mais cruel, sem ser também um Coliseu, onde a menor menção a um polegar em riste te coloca frente a leões prontos para o banquete. É um filme extremamente envolvente.
 Você que conseguiu ler isso até agora, procure assistir ao filme e me diga o que achou nos comentários.

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